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Edição 128 > Os bancos públicos e o desenvolvimento nacional

Os bancos públicos e o desenvolvimento nacional

Osvaldo Bertolino*
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A atuação dos bancos (públicos e privados) na economia brasileira é um tema de grande relevância. A importância dessas instituições para o desenvolvimento econômico fica clara desde a criação do primeiro Banco do Brasil, no século XIX, e tem aumentado ao longo do tempo. Hoje, o país debate o rumo que essas instituições devem tomar para que o Brasil cresça e se desenvolva

No dia 25 de julho de 1996, o então executivo brasileiro Henrique Meirelles foi chamado à sala de reuniões da sede mundial do Banco de Boston, nos Estados Unidos. Ali, numa sessão solene, ele recebeu oficialmente a notícia de que acabara de ser nomeado presidente mundial da instituição financeira. Encerrada a cerimônia, os senhores engravatados daquela sala partiram para a comemoração - um jantar no restaurante da sede mundial do banco. Seis anos depois, em 2002, com Luiz Inácio Lula da Silva já eleito presidente da República, ele foi chamado pelo então futuro ministro da Fazenda, Antônio Palocci, para ser o presidente do Banco Central (BC).

A causa principal da ascensão fulminante de Meirelles está relacionada às transformações radicais que se iniciavam no setor bancário. Sua trajetória meteórica neste período é reflexo da opção que os governos neoliberais - primeiro o de Fernando Collor de Mello, depois o de Fernando Henrique Cardoso (FHC) - fizeram para -modernizar- a economia brasileira - o processo de -estabilização monetária-, ancorado nas altas taxas de juros, tinha nos bancos o seu principal pilar de sustentação. Meirelles, que era presidente da filial brasileira do banco havia doze anos, encarnava como ninguém a -modernidade- anunciada com alarde desde a eleição de Collor à Presidência da República, em 1989.

No final da década de 1980 e começo dos anos 1990, quando o setor bancário norte-americano mergulhou numa de suas piores crises, os negócios latino-americanos (o Brasil, em particular) tornaram-se o muro de arrimo para os bancos estrangeiros - uma avaliação do insuspeito The Wall Street Journal. Isso explica por que o nome de Meirelles soou mais forte do que os de três outros candidatos norte-americanos que concorriam com ele à presidência mundial do Banco de Boston. Com a recessão provocada pelo Plano Collor e seu confisco, a demanda do mercado financeiro pendeu para o lado dos bancos tidos como mais seguros - os estrangeiros. Depois, logo após o Plano Real, a crise do sistema financeiro abalou ainda mais a credibilidade dos bancos privados brasileiros. Ponto para os bancos estrangeiros, como o Boston.

No final de 1995 veio a dinherama do Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer) - uma mamata de mais de US$ 20 bilhões drenada dos cofres públicos para evitar uma quebradeira generalizada dos bancos -, que prestou um serviço inestimável à consolidação da -era FHC- ao contribuir para que os bancos gerenciassem sem riscos a -estabilização-. E, de quebra, consolidou uma prática comum no Brasil: a conjunção de bancos quebrados e banqueiros riquíssimos; o que deixou o Proer coberto de ignomínia do berço à cova. Mas ele foi um instrumento que contribuiu para consolidar o Plano Real - que tinha nos bancos o seu principal sustentáculo. Uma corrida aos guichês bancários naquele momento teria efeitos funéreos para o projeto neoliberal. O saldo desta metaformose foi o fechamento de alguns bancos e a adequação do setor ao novo cenário - redesenhado pela predominância dos grandes grupos. Boa parte da geografia bancária foi ocupada pelos conglomerados estrangeiros.

Em meio ao vendaval, os bancos públicos também sofreram importantes modificações: o Banco do Brasil (BB) e a Caixa Econômica Federal (CEF) foram reestruturados; o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) passou a atuar no desmonte do Estado, à frente do programa de privatizações; e as instituições financeiras estaduais foram privatizadas sob o comando do BC. O governo Lula começou a recuparar o papel dos bancos estatais, fortalecendo as linhas voltadas para o investimento público com taxas de juros reduzidas.

A presidenta da República, Dilma Rousseff, falando no encerramento do Seminário Empresarial -Oportunidades em Infraestrutura no Brasil- realizado em Nova Iorque no dia 25 de setembro de 2013, tocou no assunto. Ela acenou para o -reposicionamento de bancos públicos no setor de crédito- e anunciou que o governo federal vem tomando uma série de medidas para enfrentar a crise e melhorar a economia brasileira estruturalmente, em meio a um ciclo de aceleração do crescimento econômico e social iniciado na década passada. Com a normalização da situação criada em 2008, quando estourou a crise, o papel atribuído aos bancos públicos de suprir o crédito diante da retirada das instituições privadas não faz mais sentido, avaliou a presidenta.

A participação dos bancos públicos na concessão de crédito, que era de 33% em 2008, saltou para 50,5% até julho deste ano. Nesse período, o Tesouro Nacional proveu cerca de 9% do Produto Interno Bruto (PIB) em recursos aos bancos estatais, sobretudo ao BNDES. -A orientação que nós tomamos é que essas instituições, as nossas instituições públicas, retornem às suas vocações naturais-, afirmou Dilma Rousseff. -Trata-se, portanto, de um reposicionamento dos bancos públicos na expansão do crédito ao investimento-, disse ela, reforçando a necessidade de participação do financiamento privado na infraestrutura do país. -Não é possível que uma expansão do porte da que nós necessitamos seja feita sem a presença dos mercados de capitais, de outros instrumentos e do sistema financeiro privado-, destacou.

O -redirecionamento- será significativo. Os investimentos em energia elétrica, telecomunicações, saneamento e transportes devem saltar de 2,33% do PIB em 2012 para 2,45% em 2013. O setor privado deve encerrar o ano com uma fatia estimada dos investimentos em infraestrutura correspondente a 1,2% do PIB. Já o setor público - considerando os bancos e fundos patrocinados por instituições estatais - responde por 65% dos recursos em infraestrutura, 72% do valor investido em transportes. São números baixos se comparados, por exemplo, com os do Chile, que investiu, em média, 5,1% do PIB em infraestrutura entre 2008 e 2011, e os do Peru, que investiu 4,22%.

Para o professor de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), José Carlos Braga, a abertura de créditos facilitados e os investimentos de bancos públicos são fundamentais para o desenvolvimento do país. -O investimento público precisa ter este perfil porque com isso ele vai puxar o crescimento de maneira decisiva-, disse ele em seminário promovido pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), vinculado à Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, em 2006. -Puxando o investimento de maneira decisiva, o investimento público impacta o setor privado, o que melhora o emprego e a oferta de mercadorias-, avaliou. De acordo com Braga, o país precisa recuperar o índice de desenvolvimento alcançado na década de 1940, quando a economia nacional crescia cerca de 8% ao ano. Ele indicou que é necessário aumentar os investimentos públicos para promover a distribuição de renda.

O investimento em infraestruturas - como estradas, pontes, hospitais, portos, saneamento básico e escolas - que são essenciais para a economia depende quase exclusivamente do setor público e tem efeitos multiplicadores, refletindo-se na geração de empregos e renda. O destino e a forma de execução desses investimentos têm uma grande incidência sobre o desenvolvimento nacional.

O discurso da presidenta para uma plateia de investidores, no entanto, foi a senha indicando que o governo reduzirá o crédito público, sobretudo o do BNDES. As afirmações de Dilma ocorreram em consonância com a recomendação de moderação das atas do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, na concessão do crédito público. O próprio ministro da Fazenda, Guido Mantega, pediu à CEF que reduzisse a concessão de financiamentos para grandes empresas.

Como parte do crédito público é direcionado - o empréstimo que o BNDES, a CEF e o BB dão a taxas menores do que a Selic -, ele passou a ser alvo dos ataques que partem dos interesses rentistas. A banca privada, da qual dependem as empresas de comunicação por serem os bancos seus credores, grandes anunciantes e parte da engrenagem financeira da qual elas pertencem, sempre esteve fortemente envolvida nas eleições, fazendo generosas contribuições aos candidatos que lhe são simpáticos.

A posição dos conservadores, no entanto, revela resultados desastrosos. Segundo o prêmio Nobel da Economia Joseph Stiglitz, a crise mundial provou que o -pensamento da direita sobre a economia de mercado- está errado. -Não há dúvida sobre isso. A direita dizia que os mercados se regulariam por si, se ajustariam por si, que se houvesse algum problema os mercados arranjariam-se por si e muito rapidamente-, disse Stiglitz, acrescentando que também -havia a noção da sobrevivência dos mais fortes-. -Mas os bancos mais prudentes não sobreviveram - foram os bancos que arriscaram mais que sobreviveram-, recordou, sublinhando que por isso mesmo a crise -fragilizou todas as teorias da direita-.

Sobre o papel dos bancos centrais, ele disse não ter dúvidas de que a ideia de controlar apenas a inflação com recurso a taxas de juro de curto prazo falhou. Ele defende que o governo tenha maior papel na economia. -As instituições que criamos na primeira metade do século XX não estão preparadas para o século XXI. Precisamos de uma nova estrutura para o sistema financeiro após a crise. Temos que achar um equilíbrio entre o mercado e o Estado. As sociedades no mundo todo estão repensando isso, reconhecendo que uma economia mais próspera e justa exige esse equilíbrio com o governo-, destacou.

Os problemas que o Brasil precisa enfrentar nesse campo não são novos. Pode-se dizer que são estruturais, daí a magnitude que eles encerram. O Brasil convive com a anomalia de uma agiotagem financeira oficializada, alimentada pela indexação de juros - TR, TJLP, TBF, CDB, CDI, over, spread, Selic etc. -, desde 1964. A Assembleia Nacional Constituinte de 1988 pretendeu corrigir a anomalia estipulando juros máximos, para qualquer modalidade, de 12% ao ano, como era antes de 1964. Mas o poder conservador passou por cima do espírito da Constituição.

O governo FHC abriu as portas para a transferência brutal de recursos públicos ao setor financeiro quando adotou a constante elevação dos juros como esteio da política de -estabilidade- da moeda. A Medida Provisória (MP) que instituiu o Plano Real anunciou o -Fundo de Amortização da Dívida Mobiliária Federal-, o embrião do superávit primário que até hoje inferniza a vida brasileira. Os neoliberais venderam ações do BNDES e cortaram despesas orçamentárias para formar o -Fundo de Estabilização Fiscal-.

Antevendo o estrago que a turma de FHC promoveria, o então presidente da República, Itamar Franco - que nunca foi o paspalhão que a mídia tentou pintar -, pediu ao Congresso Nacional que agilizasse a regulamentação do artigo da Constituição que determina o limite de 12% ao ano para a taxa de juros. Ele, no entanto, era quase uma voz isolada no país. Mas logo se veria que sua preocupação tinha razão de ser - no primeiro dia útil do Real, a taxa de juros disparou, chegando aos 12%. Um ano depois, já estava em 60%.

Outro problema grave são os escandalosos spreads cobrados pelos bancos. Eles são responsáveis por uma absurda transferência de riqueza das empresas e dos trabalhadores para o setor financeiro. Em média, os bancos pagam 12,6% quando um investidor faz uma aplicação e cobram 43,2% quando emprestam aos seus clientes. Quando o spread se refere apenas às pessoas físicas, ele é superior a 45 pontos percentuais.

O custo do dinheiro no Brasil é equivocadamente focado quase exclusivamente na redução da taxa Selic. Gradualmente, no entanto, começa-se a perceber que os juros que sufocam a economia brasileira são os aplicados ao tomador final. Para as empresas, as taxas anuais ultrapassam 38% ao financiamento do capital de giro, 45% no desconto de duplicatas e 76% na conta garantida. Para as pessoas físicas, superam 60% no crédito pessoal e 175% no cheque especial. Ou seja: os bancos multiplicam a Selic de três a catorze vezes quando emprestam para seus clientes. E ainda cobram tarifas abusivas.

Uma das propriedades do mercado financeiro brasileiro é oferecer liberdade para que os bancos decidam quanto irão cobrar sobre cada tarifa - e, inclusive, decidir quais serão as tarifas existentes. Há algum tempo, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) disse que há desconfiança de que os bancos brasileiros agem como um cartel na hora de estabelecer o preço de tarifas. O Banco Central, que deveria pôr freio nessa farra - a instituição controla com exclusividade a Casa da Moeda (emissão de dinheiro), a entrada e saída de capitais, o câmbio, o juro, o balanço de pagamento das contas externas, entre outras atribuições - na prática finge que nada vê.

Em tempos passados, o Banco do Brasil, na condição de supridor de dinheiro, controlava os juros e o dinheiro emprestado, dentro do estabelecido pela -Lei da Usura- vigente, à produção, ao consumo e ao financiamento da casa própria, com juros compatíveis com a dignidade humana. Antes de 1964, havia no Brasil crédito diferenciado e juro máximo de 12% ao ano. A agricultura levantava empréstimo no Banco do Brasil a 3,5% e 4% ao ano; a indústria, a 5% e 6% ao ano; o comércio e o transporte, a 6% e 7% ao ano.

Na Rua do Ouvidor, na cidade do Rio de Janeiro, a polícia volta e meia corria procurando prender dois tipos de contraventores: um que vendia -rabinho de coelho- para dar sorte; outro, o agiota que emprestava dinheiro a juros aos funcionários públicos a 14% ao ano. Hoje, como lembra o economista Ney Bassuino Dutra em artigo no Monitor Mercantil, respeitáveis organizações bancárias emprestam a 500% e 600% ao ano, amparadas pelo Banco Central, a instituição criada para ser -o guardião da moeda nacional-.

O cidadão Jonathan Teixeira resumiu a ópera ao revelar como funciona a farra financeira, em carta publicada no --Painel do Leitor-- do jornal Folha de S. Paulo no dia 26 de agosto 2002. --Deixa eu ver se entendi: os bancos pegam meu dinheiro, que pagam quando muito a 6%, e emprestam a 12% para os exportadores. Os exportadores, em vez de produzir, exportar e gerar empregos, emprestam o meu dinheiro para o governo a 25% e embolsam a diferença. O governo paga a eles com o meu dinheiro, dos meus impostos, e isso não é ilegal-!--, escreveu.

Muito tempo antes, Henry Ford - industrial norte-americano que revolucionou a indústria automobilística no começo do século XX - resolveu a equação ao afirmar: --Sabe-se muito bem que o povo não entende nada do sistema bancário e monetário, porque, se entendesse, acredito que haveria uma revolução antes de amanhã cedinho.-

* Osvaldo Bertolino é editor do Portal Grabois.

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